
Gondomar tem desde o dia 12 de julho mais um forte argumento a sustentar o estatuto de “Capital da Ourivesaria”: a certificação da filigrana e criação da marca “Filigrana de Portugal”. O projeto, da autoria dos Municípios de Gondomar e Póvoa de Lanhoso, foi apresentado, pela primeira vez, na Pousada do Porto, Hotel Palácio do Freixo, perante centenas de representantes do setor, familiares e amigos.
As Câmaras Municipais de Gondomar e Póvoa de Lanhoso, os dois núcleos de produção por excelência da filigrana portuguesa, apresentaram a certificação do produto “Filigrana de Portugal”.
A iniciativa veio dar resposta a um dos maiores anseios dos filigraneiros gondomarenses, fazendo-se agora a distinção entre peças 100% filigrana, filigrana e aplicação em filigrana na etiqueta que acompanha o produto final.
A certificação de produções artesanais passa a constar do Sistema Nacional de Certificação das Produções Artesanais Tradicionais, sendo, assim, a filigrana o primeiro produto certificado do concelho.
“Este passo começou em 2013, quando sufragamos uma mudança de imagem de Gondomar, em que decidimos valorizar a história e traços de identidade do concelho de Gondomar, sempre em diálogo com os industriais, artesãos e empresários. Agora queremos fazer da ‘Filigrana de Portugal’ uma grande marca, com valor acrescentado a nível internacional”, diz Marco Martins, presidente da Câmara Municipal de Gondomar.
Ao seu lado, Avelino Silva, presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Lanhoso, mostrou-se igualmente satisfeito pela conquista da certificação de uma arte secular e identitária de ambos os concelhos.
“Era uma ambição antiga que agora se concretiza. Além disso, é um ato de justiça para com os artesãos que há muitos séculos preservam esta técnica, não desistindo de afirmar a filigrana como elemento distintivo na ourivesaria tradicional”, afirma. Os autarcas não deixaram de assinalar a sinergia que garantiu a certificação da Aderecertifica, organismo de certificação acreditado pelo Instituto Português de Acreditação.
A certificação pretende preservar as características de uma produção artesanal, autónoma no seio da ourivesaria portuguesa. As especificidades técnicas que definem o processo produtivo, predominantemente manual e utilizando técnicas e utensílios ancestrais, estão discriminadas no caderno de especificações, documento normativo que regulamenta esta norma. Desta forma, cada unidade produtiva tem um punção e etiqueta para colocar na peça certificada.
“A filigrana teve um crescimento exponencial nos últimos anos. A certificação é mais uma forma de diferenciar e distinguir esta arte. Ao mesmo tempo, permite impulsionar uma lógica associada à procura turística. Felizmente, o processo resultou de uma vontade dos municípios e dos artesãos e trouxe uma mudança muito positiva para o setor”, afirma Eunice Neves, diretora do CINDOR – Centro de Formação Profissional da Indústria de Ourivesaria e Relojoaria.
O benefício é partilhado por Carlos Brás, vereador do Desenvolvimento Económico do Município de Gondomar. O autarca foi um dos principais impulsionadores do processo de certificação e criação da marca “Filigrana de Portugal”, tendo desafiado os artesãos.
“Fizemos um levantamento exaustivo junto dos artesãos de Gondomar e da Póvoa de Lanhoso. Em conjunto, definiram-se todas as regras que estão plasmadas no caderno de especificações. Esperamos agora que no próximo ano o número de membros possa ser alargado, caso a comissão assim o entenda”, explica o vereador.
Para o autarca, uma das principais vitórias foi reunir os ourives dos dois concelhos. “Sabemos que é um setor que vive do sigilo, mas foi realmente uma grande conquista. Foi percebido que o benefício comum era maior que o pessoal”, acrescenta Carlos Brás. O lançamento do produto contou com vinte e uma Unidades Produtivas Artesanais pioneiras que poderão exibir nas suas peças a marca de certificação com a chancela da “Filigrana de Portugal”.
Ourives satisfeitos com a certificação
No total, 12 ourives de Gondomar e nove da Póvoa de Lanhoso aderiram ao processo de certificação e da marca “Filigrana de Portugal”.
O Vivacidade conversou com quatro filigraneiros gondomarenses e todos reconhecem o mérito da iniciativa.
“É preciso que o cliente saiba o que está a comprar”
António Almeida, fundador da ARPA, é um dos aderentes ao processo de certificação. Para o ourives, “é um processo interessante para uma arte tradicional”. “É preciso que o cliente saiba aquilo que está a comprar. No entanto, fiquei surpreendido com a etiqueta, porque pensei que iria distinguir claramente entre os 50% e 100% de filigrana. Julgo que no futuro será pertinente explicar essa diferença ao consumidor final”, refere.
“É preciso valorizar ainda mais a filigrana”
Na oficina da sua casa, em Jovim, António Cardoso trabalha mais uma peça enquanto recebe o nosso jornal. O filigraneiro, que esteve na origem do processo de certificação, diz-nos que este reconhecimento “não vem resolver todos os problemas da filigrana”, nem “acaba com a filigrana industrial”, que diz ser necessária. No entanto, explica, “valoriza ainda mais o que é 100% artesanal”. “Para já estou a manter os preços que praticava, mas o objetivo é acrescentar valor às peças”, admite.
“A grande vitória foi ter unido os ourives”
O mais jovem ourives de Gondomar, Arlindo Moura, também se associou à marca “Filigrana de Portugal”. O artesão faz parte de uma família dedicada à ourivesaria e procura misturar a filigrana com a cortiça nas suas peças. “Para mim, a grande vitória deste processo é o facto de ter sido capaz de unir os ourives. Isso, só por si, é uma grande conquista. No que diz respeito à marca, acho que é muito positiva, porque a filigrana esteve prestes a desaparecer e agora, com esta certificação, volta a reafirmar-se”, faz notar.
“A certificação veio, finalmente, separar as águas”
Para Conceição Neves, a mais jovem filigraneira de Gondomar, o processo de certificação “veio, finalmente, separar as águas”. “Quem respeita verdadeiramente esta arte, vê agora reconhecido todo o seu trabalho e empenho. Sou filha de filigraneira e sou filigraneira, por isso olho para esta arte numa perspetiva artesanal. Só assim se pode chamar filigrana”, conclui.
Filigrana a Património Imaterial da Humanidade
Durante a apresentação pública da “Filigrana de Portugal”, Marco Martins apontou baterias ao próximo objetivo, uma candidatura da filigrana a Património Imaterial da Humanidade, que considerou “o próximo grande desafio para o concelho e para o país”.
Também Avelino Silva, presidente do Município da Póvoa de Lanhoso, considera o estatuto merecido, “pela preservação de uma arte que tem um valor cultural incalculável”.
O processo de certificação
A certificação de produções artesanais consta do Sistema Nacional de Certificação das Produções Artesanais Tradicionais publicado no Decreto-Lei 121/2015, de 30 de junho.
A pedido dos Municípios de Gondomar e Póvoa de Lanhoso, o processo iniciou-se com a elaboração de um caderno de especificações, realizado pela Associação Portugal à Mão, aprovado pela Comissão liderada pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional. Seguidamente foi realizado um registo de Indicação Geográfica e de marca no Instituto Nacional da Propriedade Industrial.
A certificação é efetuada por uma entidade neutra e imparcial, a Aderecertifica, acreditado pelo Instituto Português da Acreditação. A Aderecertifica criou uma Comissão de Acompanhamento que monitorizará todo o processo.
Filigraneiros aderentes de Gondomar
Alberto Moura Oliveira
António Cardoso
António Martins de Castro & Filhos
ARPA
Celior
Classic Silver
Conceição Neves
F. Ribeiro
José Alberto Moura
Manuel Fernando Oliveira
Só Ouro
Topázio